Descrição
O Conto do Vigário – O Sem-Amor ou o Major sem Serotonina
Em comum nestes dois contos surge a questão do abuso do álcool e do seu efeito pernicioso; no primeiro texto utilizado para ludibriar intencionalmente terceiros, que, ignorando-se vítimas da avidez e de um ardil engenhoso – o famoso Conto do Vigário -, acabam por ver-se enredados num crime sem culpados, e no segundo texto, ao mesmo tempo narrativa de ruína e redenção, o álcool é meio para ludibriar a si próprio, o sem-abrigo, ajudando-o a alhear-lhe da sua condição, não de sem-teto mas de sem-amor.
«E a história do “conto de reis do Manuel Vigário”, passou, abreviada em “o conto do Vigário”, para a imortalidade quotidiana, esquecida já da sua origem. Os imperfeitíssimos imitadores, pessoais como políticos, do mestre ribatejano nunca chegaram, que eu saiba a qualquer simulacro digno do estratagema exemplar. Por isso é com ternura que relembro o feito deste grande português, e me figuro, em devaneio, que, se há um céu para os hábeis, como constou que o havia para os bons, ali lhe não deve ter faltado o acolhimento dos próprios grandes mestres da Realidade. »
in O Conto do Vigário
«Tratar? Tratar o quê? O álcool, que o ia matando aos poucos, também o mantinha vivo. Vivo e anestesiado, sem dores nem depressão. «O homem sofre porque pensa», dizia Malraux. Ele bebia e não pensava. Um dia batera com a cabeça no chão e fora parar ao hospital. Na urgência, o diagnóstico tinha sido fácil: sem-abrigo alcoólico. À saída, com a receita na mão, pensara deitá-la logo fora, não servia para nada. Mas guardara-a para a levar à sua assistente social, talvez tivesse mais algumas regalias, iria pedir-lhe algum dinheiro. Nos serviços sociais era um alcoólico sem- -abrigo, nos hospitais era um sem-abrigo alcoólico!»
in O Sem-Amor…